quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007

Divagações de Um Leigo

Kafka não concluiu o Castelo.

Não sei o porquê disso, afinal, sou leigo (no momento estou com 47 anos e trago essa característica, excesso de anulidade de conhecimento, desde os tempos de juventude, em que, por falta de culhão e iniciativa, passava as manhãs, tardes e noites a jogar Mario e bater punheta - quando o tédio era grande e enquanto o membro fálico ainda se mantia ereto e íntegro).

De outas coisas entendo - são poucas, quase nulas, confesso, as coisas das quais entendo - mas de Kafka não entendo um ovo. Apenas sei que o Castelo ficou inconcluso (por que será? Será que lhe faltou tijolos? Mão-de-obra especializada?...Infâme essa piada. O tipo de piada que só um leigo pode arquitetar). Disso eu sei (repare: nem tudo está perdido. alguma coisa sei!) porque há tempos atrás (décadas, eu diria) a guria que me namorava, na ocasião, certa vez comentou, assim como quem não quer nada (será? será que ela já não estava comentando de propósito pra testar minha carência de sabedoria? pois é. Mais uma coisa que não sei e nunca saberei) "estou a ler um livro do Kafka, que, por sinal, ele não chegou a terminar." Achei instigantemente engraçado aquilo: ela, mesmo não lendo a obra até o fim - entenda-se "fim" como "até onde Kafka escreveu" - sabia que era um romance sem epílogo. E mais ainda: por que cargas d'agua se aventurar, se embrenhar em algo já sabido que vai interromper-se de sopetão, sem saciar nossa fome de ponto final, sem o arrepio trasnmitido por um ostentoso "the end"? Por quê? Por quê? (expressão essa que, como em todo bom leigo, esteve presente em toda a minha vida a latejar no vasto latífundio que sempre foi minha cabeça - apenas na cabeça, nunca vindo a explodirem forma de oratória através da língua).

Ao contrário de mim, ela não era leiga. Entendia de Kafka e sabia o motivo do não término do Castelo. Chegou a me explicar até, mas eu, no ápice da minha energia sexual não dei a mínima: esqueci. Só queria eu saber de beijinhos e abraços e arretões - beijei abracei e arretei tanto que acabei por me tornar mais leigo ainda.

Eu, leigo de Kafka, apresentei a ela, leiga de Frank Jorge, um cd do próprio. Foi um trato inconsciente. Eu dizia "Frank é o cara" ela dizia "Franz é o cara". Acabou se sucedendo que ela virou fã do jovemguardiano e eu, tomando vergonha na cara, e disponibilizando espaço em meu cérebro para um feiche de esperança (quero saber! quero saber!), fiz um empréstimo na biblioteca pública. Metamorfose. Li, porém, continuei leigo. Nada contra (não sou leigo porque quero, sou porque sou) mas simplesmente não consegui prestar a devida atenção que deveria àquelas páginas. Eu estava com a cabeça cheia (beijinhos, abraços e arretões) e com o espírito de leigo mais aguçado do que nunca. Qual era mesmo o nome da barata? Era barata, não? Ela morre no fim? Tinha pai e mãe? Não recordo, não sei, não faço idéia, não me desperta o interesse, não me arrepia os cabelos das pernas, afinal, sou leigo. Leigo de uma forma amordaçante, de uma forma angustiante.

(Ultimamente - talvez por causa disso - tenho acordo sobressaltado, papas de suor no ventre da madrugada, com a inquietante sensação de que faltarão tijolos pra a conclusão do meu prórpio castelo.)

2 comentários:

mari korman disse...

continua escrevendo pánóis aí.
:]

e eu gostei tanto da metamorfose...

Daniela! disse...

eu, como blogueira viciada da porra, adorei qua criaste esse blógue!

escreve mais!